segunda-feira, junho 23, 2008

Como escrever quadrinhos - criação de personagens

Um dos primeiros problemas para se construir a história são os personagens. Toda HQ precisa de personagens, mesmo que sejam um gato, um dinossauro ou uma pedra rolando por um despenhadeiro.
A construção de personagens tem sido tema de teóricos teatrais, cinematográficos, etc... sem que se chegue a uma conclusão decisiva. De modo que não pretendo dar a última palavra sobre o assunto. Longe de mim. Mas posso dar alguma dicas.
A primeira delas é aprender a observar as pessoas. Da mesma forma que um desenhista precisa precisa ver um anão para desenhar um anão, um roteirista precisa conhecer e entender um neurótico para poder escrever sobre um personagem neurótico.
Há um exercício muito útil : observar as pessoas no ônibus. Escolha uma pessoa e comece a observá-la, dando uma de Sherlock Holmes. Através da aparência externa, tente descobrir quem é aquela pessoa, como ela pensa, de onde vem...
Por exemplo, se, de noite, você encontra no ônibus uma garota muito bem vestida, é provável que ela esteja indo para uma festa. Se ela estiver levando cadernos ou uma bolsa grande, essa teoria estará furada, pois pessoas normais não costumam levar cadernos para festas. Pelo tipo de roupa é possível imaginar para que festa ela está indo. Se ela olhar insistentemente no relógio, é provável que a tal festa signifique muito para ela. É provável que nessa festa esteja alguém importante. Um ex-namorado do qual ela ainda gosta, por exemplo. Ela sabe que a festa será uma grande chance para a reconciliação e por isso se sente ansiosa...
Você pode compor todo um perfil psicológico baseado nessas especulações. Essa garota poderá ficar numa espécie de "arquivo mental" para ser usada posteriormente em uma história.
Outra grande dica é pesquisar livros de linguagem corporal. Na maioria das vezes o corpo fala mais do que as palavras. O escritor policial Dashiel Hammett era um especialista no assunto. Suas descrições detalhadas dos gestos dos personagens muitas vezes indicavam ligações insuspeitas entre estes que iriam influenciar no final da história...
Um exemplo quadrinístico. Quem tiver conhecimentos mínimos de linguagem corporal vai percerber que o personagem Rorschach, de Watchmen, é um homossexual e nutre uma paixão platônica pelo amigo Nite Owl.
Ainda sobre a criação de personagens, é importante ter em mente o que ele significa, o que ele representa. Batman é um homem obcecado pela idéia de ordem. "O mundo só faz sentido se você o força a ter", ele diz em Cavaleiro das Trevas. Batman é o protetor de Gothan e, para cumprir a missão que ele mesmo se incubiu, vale qualquer coisa, até mesmo recrutar uma criança (no caso, o Robin).
A história Para um Homem que Tem Tudo, mencionada anteriormente, é um interessante estudo de personagem. Nela, descobrimos que o maior sonho de Super-homem é que Kripton não tivesse sido destruído. O maior sonho de Batman é que seus pais não tivessem morrido. Portanto, se seus sonhos tivessem se realizado, eles jamais seriam super-heróis. Super-homem sente-se um alienígena em nosso planeta, um órfão completo. Já Bruce Waine talvez se sinta culpado pela morte dos pais. Moore expõe sua opinião de que só pessoas neuróticas e infelizes se tornariam super-heróis.

2 comentários:

Anónimo disse...

muito bom texto.

Mas discordo sobre a homosexualidade de Roscharch. O indicio usado pelos criticos é apenas uma toque de mão entre os dois que demora demais pra acabar e nada mais.
Não há nada realmente SEXUAL sobre isso.
Roscharch é assexual e averso ao toque humano. Toda a história dele mostrada em flashbacks reforça isso. E esse toque de mãos é uma quebra de suas proprias regras, uma demostração de afetividade, mas não homosexualidade.
além disso ele também é um personagem derivado do THE QUESTION e de sua versão mais "pura" O MR.A personagens criados por Steve Ditko para expor suas filosofias baseadas no Objetivismo de Ayn Rand.
A Filosofia Objetivista entende o sexo como uma celebração dos valores humanos. Um Objetivista defende que a atração para um objetivista só ocorre apenas por alguém que espelhe e incorpore altos valores morais, o que o Coruja definitivamente não é.

Quanto aos Super-herois neuroticos, bom, isso é verdade não ?

meu Nome não é Jonnhy

Fernando S. Trevisan disse...

Essa capa, com o Robin de boca aberta bem na altura do "super-pênis", é significativa! hehehe

Não consigo ver o Robin sem lembrar (em flashs, pq eu era novo demais) da palestra do Will Eisner na Escola Panamericana em SP, em 90 e nem lembro quanto.

Ótimo acompanhar o blog, é difícil encontrar material para quem tem pretensões de roteirista em quadrinhos aqui no Brasil.

Abs!